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Arte por Tania Herrero. |
Após salvarem o vilarejo da terrível ameaça de um gigante no céu e
resgatar aldeões de seu vilarejo, os aventureiros deleitaram em sua vitória.
Contudo, mal sabiam eles que algo os observava oculto. Algo esperava apenas uma chance para obter sua vingança. E suas maquinações poderiam levar o grupo a criar a perfeita oportunidade.
Sobre as últimas sessões
Nas últimas empreitadas deste estranho grupo de aventureiros, um
esdrúxulo causo se sucedeu. Uma planta impossivelmente grande cresceu do dia
para a noite, subindo até as nuvens e levando até um castelo no céu, morada de
um terrível e mesquinho gigante. Após se envolverem em inúmeros perigos, nossos
heróis conseguiram dar cabo do gigante, derrubando-o das nuvens à seu
inescapável destino, a morte. Saudados como salvadores do vilarejo atormentado
pela ameaça, os aventureiros receberam inúmeras honrarias e recompensas.
Confira o restante de nossas aventuras.
A Galera
Manel, velho elfo guerreiro, 2º nível,
Cicinho, meio gigante 1º nível [Igor].
Ximbica, guerreiro cangaceiro, 1º nível;
Martina, bruxa, 1º nível [Thigas].
Corvus, ladrão sombrio, 2º nível [Diego].
Beto, o vigarista, 2º nível; Scaminosflaw, o
mago, 2º nível [José].
Uma figura nas sombras
Iniciei a sessão descrevendo ao jogador do meio gigante Cicinho uma cena
de pesadelo. Um globo de escuridão o observava de maneira ameaçadora e por mais
que o personagem tentasse correr, não conseguia escapar. Ele acordou de súbito,
causando uma comoção na hospedaria onde dormia o grupo e despertando o restante
de seus companheiros para uma cena de invasão. O andar onde dormiam apresentava
sinais claros de pegadas que cobriam todo o corredor e sinalizavam a invasão de
alguns quartos, dentre eles o do mago Scaminosflaw e do próprio Cicinho.
As pegadas daquilo que parecia uma criatura inumana apontavam que o
invasor havia parado ao lado da cama do mago. Pedi uma jogada de Vontade para o
jogador e indiquei que ele havia perdido 3 pontos de Inteligência e sofria uma
forte enxaqueca. Intrigados pelo acontecimento, os jogadores me informaram que
iriam buscar maneiras de investigar, talvez seguindo as pegadas ou conversando
com a dona da hospedaria.
O ladrão Corvus e o vigarista Beto se aproveitaram da boa vontade da
dona da hospedaria (que eles, aliás, já haviam passado a perna na aventura
anterior) e arrancaram um cupom "vale-presente" que poderiam gastar
no boticário de sua sobrinha. Além disso, Beto também decidiu ir até a
construção de sua igreja, observar como andava a obra e tudo mais.
Ximbica, um dos aldeões libertados durante o incidente do castelo no
céu, havia se juntado ao grupo e decidiu se reunir com Cicinho, tentando
acalmá-lo e ajudá-lo enquanto descansavam nos arredores da hospedaria.
Martina, a filha do prefeito, também havia se unido ao grupo e decidiu
utilizar-se de seus poderes recém despertados para buscar auxílio ou pistas
acerca do ocorrido. Realizou um ritual xamânico e se conectou com o espírito de
Mestre Ensinador, entidade feérica que havia aprisionado em seu corpo, numa
tentativa de obter informações acerca do que poderia ter os atormentado na
noite anterior.
O mago Scaminosflaw conjurou cães farejadores para rastrear de
onde vinham e para onde iam as pegadas. Descobriu rastros que levavam à
floresta que rodeava o vilarejo mas que se perdiam entre as árvores. O elfo
ancião Manel, por sua vez, interrogava a senhorinha da hospedaria, tentando
usar um pouco de charme para descobrir se ela havia percebido algo de estranho.
Todos faziam alguma coisa e eu deixei mais ou menos em aberto o que
poderiam fazer no vilarejo, onde desejariam investigar ou o que gostariam de
fazer durante o dia. Beto ouviu que os construtores temiam alguma coisa, uma presença
amedrontadora que parecia caminhar por entre a floresta. Corvus fez amizade com
Hannah, a boticária, e aceitou acompanhá-la até o cadáver do gigante que
repousava nos arredores do vilarejo. Martina lembrou de boatos acerca de uma
bruxa da floresta. Manel conversou com um estranho hóspede recém chegado na
cidadezinha, um tal de Barbazul, sujeito esquisito.
Em determinado momento estavam Corvus, Beto, Scaminosflaw e a boticária
investigando os arredores do cadáver titânico. A mocinha elfa Hannah discorria
acerca de possíveis propriedades do pé de feijão mágico e dizia que gostaria de
encontrar uma possível flor preservada para estudos posteriores. Interpretei
Hannah de um jeito bem divertidinho, espero que possa explorar mais da
personagem futuramente. Bem, o local onde exploravam se revelou um grande nojo.
O cadáver se decompunha, ainda que de forma atrasada devido a aura mágica do
gigante, e exalava um odor terrível que atraía vermes e criaturas necrófagas
como abutres e algumas espécies de lobos. Tiveram de evitar um bando desses
canídeos, mas descobriram que o cadáver possuía marcas de mordidas bestiais e
sinais de que o um dos olhos havia sido arrancado.
Chamaram o restante do grupo para averiguar as possíveis pistas e,
quando se preparavam examinar o corpo do gigante, ouviram um estrondoso urro
vindo da borda da floresta, há uns vinte metros. Uma criatura monstruosa se
revelava diante dos aventureiros. Bípede, pouco mais de dois metros e meio de
altura, pelos grossos, chifres pontiagudos, olhos vermelhos sedentos por
sangue. Uma mescla bizarra entre humano e bovino, uma criatura vinda
diretamente do inferno. Era um terrível bovisomem! Alguns personagens lembravam
da silhueta do monstro, era como aquela da noite do baile dos diabos. Seria a
mesma criatura ou outra da mesma espécie? Não sabiam, mas ela parecia pronta
para a batalha.
Pedi para que me indicassem suas ações e eles decidiram se preparar para
combater a fera, que investiu com toda sua força e perfurou o ladrão com um de
seus chifres. O mago conjurou outro animal, desta vez um gorila e ordenou que
atacasse. Logo o grupo cercou a besta-fera e começou a atacá-la com tudo que
tinham, deixando-a à beira da morte. O bovisomem, então, agarrou Cicinho e
tentou forçá-lo rumo a um tronco quebrado pontiagudo, na tentativa de
empalá-lo, mas o meio gigante venceu na competição de forças e empalou o
próprio no lugar.
Respiraram aliviados por terem saído com vida. Teria se resolvido o
mistério da criatura misteriosa? Na verdade, não. Perceberam que os cascos do
bovisomem não coincidiam com os rastros inumanos que investigavam. Provavelmente
o monstro havia apenas sido atraído pela carcaça do gigante. O mistério ainda
pairava no ar.
Mente de titânio
O grupo apresentou súbito interesse na carcaça do gigante, mais especificamente em seu crânio pútrido. Scaminosflaw, o mago, indicou que tinhas curiosidade em partir a cabeça do cadáver ao meio e investigar seu interior, logo foi atrás de materiais que pudesse utilizar para realizar a empreitada. Corvus, por sua vez, aparentou impaciência e seguiu pela fenda ocular, rastejando por entre a carne podre em busca de alguma pista. Manel, preocupado, seguiu logo atrás.
Descrevi como subitamente a fenda de carne foi envolta num aspecto
nebuloso e pareceu alterar sua forma. O par de aventureiros se via num campo
esbranquiçado e esquisito e sentia como se estivesse dentro de uma nuvem ou
algo parecido. A "névoa" passou a se acumular e mudar de forma,
transformando-se numa cena como num sonho. De repente estavam no castelo do
gigante outra vez e viam ao próprio grupo fugindo do vilão, que repousava no
chão, caído. Relembraram daquele momento da aventura passada, no qual atingiram
o gigante com uma magia de Mestre Ensinador e aproveitaram as circunstâncias
para fugir. Corvus começou a elaborar uma teoria de que estavam na mente do
gigante, que de alguma forma conseguia reviver suas memórias.
O gigante percebeu os invasores em sua consciência, mas parecia
ignorante acerca do estado pós-morte no qual se encontrava. Avançou furioso em
direção a Corvus e Manel, mas o ladrão rapidamente percebeu que, caso sua vontade
fosse poderosa o suficiente, poderia moldar o ambiente onírico ao seu redor e
utilizou essa habilidade para encontrar um ponto para se esconder. O elfo
ancião escolheu encarar a ameaça de frente e a atacou com seu pesado martelo.
Pedi um teste difícil, mas ele foi bem-sucedido. Um clarão de luz ofuscou o
lugar.
Enquanto isso, do lado de fora, Scaminosflaw voltava com os equipamentos
para efetuar seu plano de partir o crânio. Descobriu acerca dos companheiros
que descuidadosamente adentraram o cadáver e não mais retornaram. O grupo
decidiu se apressar, pedi alguns testes, mas pareciam sem sorte.
Em meio às memórias do gigante morto, o par de aventureiros se viu num
espaço diferente, algo como um deserto prateado com o céu escuro. Perceberam um
tipo de construção mais à frente e avançaram para averiguar, encontrando um
templo antigo e o próprio gigante, que conversava com uma figura misteriosa.
Era outra memória, dessa vez acerca de algo que os personagens desconheciam. O
ladrão atravessou entre algumas rochas e se aproximou da conversa, mas foi logo
percebido pela figura misteriosa, que se apresentou como um gênio, uma entidade
poderosíssima, mas que estava aprisionada. Corvus se perguntou como a entidade
conseguia estar consciente dentro de uma memória, mas aquilo deveria estar
dentre as capacidades do poderosíssimo ser. Manel se aproximou também e
informou ao gigante acerca da situação: ele estava morto e aquilo era apenas
uma de suas memórias. Confuso, ele resistiu a informação, mas logo começou a se
questionar de si mesmo e o que teria acontecido a ele. Foi então que ouviram as
batidas.
O restante do grupo, que ficara do lado de fora, finalmente conseguira
abrir uma fenda no crânio do cadáver. As batidas ressoavam dentro do
sonho/memória. O par de aventureiros não sabia o que viria por aí, mas sabiam
que algo estava para acontecer. O gênio, sem mais tempo a perder, informou que
ele e o gigante teriam realizado um pacto: ao blindar sua mente contra ataque
mentais, o gênio teria a garantia de que seria posteriormente libertado.
Contudo, com a morte do gigante, a entidade estaria selada para sempre. Ele
ofereceu aos personagens um trato: caso fossem ao seu resgate, teriam um desejo
realizado. Antes de dizer onde estaria localizada sua prisão, foi interrompido.
A próxima coisa que Manel e Corvus viram foi a luz do sol. Estavam em
meio a massa encefálica do cadáver, banhados por gosma pútrida. O interior do
crânio estava revestido com um material metálico, que identificaram como
titânio. Compreenderam que aquela era a tal blindagem do gênio e por isso a
consciência do gigante estava presa mesmo após a morte. Talvez a tal blindagem
fosse uma proteção contra Mestre Ensinador, a entidade feérica que desejava
possuí-lo mas agora estava presa no corpo de Martina. Mas... Agora que a
consciência do gigante estava livre da mente de titânio, o que aconteceria?
Imediatamente respondendo a suas dúvidas, uma voz trovejante ecoou pela
clareira da cratera. O gigante, libertado de sua prisão mental não aceitava a
própria morte e culpava os aventureiros por sua queda. Seu ódio mantinha sua
alma e sua experiência pós-morte lhe concedera controle sobre aquilo que não
vive... Nesse momento, indiquei aos personagens que a alma enfurecida iniciara
um tipo da catástrofe necromântica, fazendo os mortos começarem a emergir da
região da floresta. O cadáver do bovisomem também se levantara! A presença
ameaçadora sob o local exercia uma pressão inegável! Eu tinha muita coisa
preparada para a possibilidade dos personagens libertarem a alma enfurecida do
gigante... Mas não contava com uma coisa.
Scaminosflaw, ao lado do crânio recém aberto, imediatamente puxou sua
chave mágica gigante, conseguida na última aventura. O jogador disse que usaria
ela no cérebro do cadáver, como se fosse abrir uma fechadura. Pensei por um
instante. Isso abriria o corpo do cadáver, espiritualmente falando. A abertura
criaria uma vazão imediata, dissipando aquilo que restava da alma enfurecida.
Então, a cena se sucedeu mais ou menos assim: alma do gigante libertada!
Catástrofe necromântica! Trilha sonora de armageddon! Jogadores giram uma
chave. Catástrofe resolvida.
Não era nem de perto como eu imaginei que essa situação se desenrolaria,
mas o jogador teve uma ideia tão boa e agiu tão rápido que eu não poderia retirar
essa vitória dele.
Mas aí eu pensei numa boa complicação. O que ele tinha acabado de fazer
tinha aberto margem para algo ainda melhor. Deixe-me explicar. Os
aventureiros tinham ido até o cadáver investigar acerca de algum tipo de
criatura que havia invadido seus aposentos na noite anterior. Haviam enfrentado
alguns perigos, certo, mas não tinham encontrado a figura misteriosa ainda. Eis
que, nesse momento, descrevi que Manel, o elfo ancião, começou a se sentir
esquisito. Seu corpo começou a tremer, ele adquiriu características bestiais
enquanto seu corpo parecia se retorcer e transformar. Manel começou a se
transformar em outra coisa, algo de fora desse mundo. Seus amigos foram a seu
auxílio, tentar protegê-lo (de maneira similar como quando alguém tem uma
convulsão) e notaram que seus pés adquiriam aspectos idênticos ao padrão de
pegadas que investigaram... De repente um dos globos oculares de Manel explode
e se separa do resto do corpo. O elfo volta a sua forma original enquanto seu
globo ocular flutua no ar.
Uma risada malévola preencheu a mente dos presentes. A voz de Lorde
Olho, o lorde alienígena que haviam enfrentado em sua incursão a Fortaleza de
Ferro, foi imediatamente reconhecida. Com seu característico discurso de vilão
(eu fiz uma entonação de voz de vilão cartunesco para ele), o inimigo explicou
que havia transferido uma parte de sua consciência para o elfo quando foi
derrotado pelo grupo e vivia em seu subconsciente, tomando controle quando o
guerreiro dormia. Havia se aproveitado para reunir poder o suficiente e
aguardava o momento oportuno para pegar os aventureiros de surpresa e completar
sua vingança. A blindagem mental agora tinha uma fenda. A chave mágica havia
aberto o caminho perfeito. O olho flutuou para longe do alcance do grupo... E
mergulhou na direção do cérebro do cadáver.
Conclusão
O presente capítulo de nosso diário de campanha comprime o relato de
duas sessões e acabou num gancho insano. A consciência de um lorde
alienígena tomando controle do corpo de um gigante zumbi? Isso parece ser muito
doido. Isso, para mim, é a epítome do gênero gonzo. Aliás, eu preciso tomar um
tempo para discutir por aqui o que exatamente é isso que chamo de gonzo.
Nossa aventura foi cheia de reviravoltas e conceitos estranhos se entrelaçando, mas no final das contas os jogadores adoraram — e eu também. Vejamos como as coisas se desenrolaram nessa boss fight no próximo capítulo de nosso diário.
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Desenho feito por um de meus jogadores, José. |
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