Posted by : luh reynaud sexta-feira, 15 de novembro de 2019

Qual a relação entre RPG e depressão?

Saudações, companheiros de aventuras e colegas de taverna. Após um período de hiato de quatro meses, anuncio meu retorno a meu querido e amado Crítico 6! Por muitos motivos fui obrigado a me afastar do blog e até mesmo da prática do RPG durante esse intervalo de tempo – foram tempos difíceis nos quais cheguei a pensar em desativar o site… Mas algo sempre me manteve com um fio de esperança. E justamente disso que venho falar aqui hoje.

Um pouco de psicologia e saúde

O mundo em vivemos está cada vez mais rápido, difícil e cheios de mudanças constantes. As relações familiares, de trabalho, educacionais etc exercem pressões enormes sob os indivíduos – isso sem contar as próprias questões interpessoais que afetam a mente. Quando não conseguimos lidar com todo esse estresse, essas relações causam angústia que pode nos adoecer e causar dor. E é aí que nascem as psicopatologias ou problemas de saúde mental. Dados da Organização Mundial de Saúde revelam que pelo menos 9,3% da população mundial sofre de Ansiedade, uma psicopatologia caracterizada por ataques de pânico, angústia generalizada e sintomas compulsivos. Ao mesmo passo, estima-se que cerca de 300 milhões de pessoas ao redor do mundo sofram de Depressão, uma doença caracterizada pelo humor deprimido, desânimo geral, sentimento de culpa, baixa autoestima, dentre outros sintomas que, no pior dos casos, podem levar ao suicídio.

Sou graduando em psicologia e já há algum tempo enfrento alguns desses problemas, portanto posso afirmar por experiência as dificuldades e limitações causadas pelos transtornos de saúde mental. Há poucos meses mesmo as atividades que normalmente me geravam prazer – como jogar RPG ou escrever – eram um verdadeiro desafio a ser enfrentado. Até mesmo minhas relações sociais foram gravemente afetadas. Hoje em dia, com o tratamento adequado, é bem visível o quanto isso está sendo revertido. E o meu hobby preferido, o RPG, tem me ajudado demais a sair dessa.

Alguns estudos da Unicenp de Curitiba destacam dados acerca das habilidades sociais de jogadores de RPG, que se mostram par a par com as habilidades de não-jogadores e, em alguns casos, como habilidades relacionadas a falar em público, mais proeminentes. John Hughes, estudioso em antropologia, sustenta essa afirmação através de seu estudo acerca do uso terapêutico do RPG de mesa, onde analisa os símbolos criados dentro do contexto da fantasia e como os jogadores podem se empoderar durante o jogo, aumentando suas capacidades sociais e enfrentando seus desafios projetados no mundo da fantasia.

Em alguns momentos, os transtornos podem parecer um terrível monstro.

Magia de ressurreição!

Durante meu pior período, cheguei a tentar jogar RPG com meus amigos que insistiam para que eu mestrasse pra eles. Eu o fiz em formas de oneshots, que, bom, não eram tão divertidas assim pra mim, pelo menos não enquanto mestre, o que me fez perder um pouco da fé no RPG. Contudo alguma coisa, bem lá no fundo, me dizia que eu deveria ter paciência e que quando eu estivesse melhor, iria inevitavelmente retornar.

Então, há pouco mais de um mês eu finalmente me empolguei pra jogar de novo. Meu exemplar de Space Dragon havia chegado há poucos dias e eu já tinha o devorado inteiro. Com um sistema de jogo muito divertido e uma proposta fantástica, Space Dragon captou minha atenção completamente. Fiz o que não fazia há tempos, reuni meus amigos, batemos papo, rimos, criamos personagens legais e jogamos. E pela primeira vez em meses, eu me diverti. Estar em meio aos meus amigos e me sentir importante dentro do processo do jogo me fez perceber minha própria imagem de forma diferente e construir uma narrativa emergente baseada na minha vivência e nas minhas expectativas.

Não sou o único que encontrou no RPG uma forma de se reintegrar dentro do círculo social, vários estudiosos contam casos de pacientes que encontraram no RPG uma forma de se empoderar, socializar e compreender a si mesmo, e dentre eles o psicoterapeuta Wayne D. Blackmon. Em seu case, Blackmon discorre acerca de um de seus clientes com transtorno depressivo e como os jogos de fantasia o ajudaram a externalizar suas fantasias inconscientes e aprender a lidar com as mesmas.


Conclusão

Esse texto é um grande desabafo sobre tudo o que passei e tudo que aprendi durante meu pior período e talvez possa ser um raio de esperança para aqueles que se encontram em situações difíceis. Ademais, pudemos vislumbrar um uso em conjunto entre o RPG e a psicoterapia, talvez como uma forma de explorar nossas masmorras mentais e derrotar os dragões que lá habitam.

Fontes:

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  1. Muito bom o texto e um passo do caralho tu escrever sobre isso. Parabéns, mano!

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  2. Texto show. O RPG é uma ferramenta de apoio ,não apenas didática, como social e psicológica. Me salvou de um abismo profundo, que julgava sem volta.

    Franz Andrade

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  3. Eu desde muito cedo tive contato com esses grandes "monstros" da vida real.
    O RPG fora algo que desejava imensamente jogar, por muito tempo pesquisei, estudei e finalmente consegui um grupo pra jogar.
    Aquilo me salvava, me divertia, um prazer que não sentia com nada mais.
    Mesmo que ainda me fruste as vezes não conseguir mestrar aquela ceninha especial do jeito que queria (seja por falta de experiência ou timidez mesmo) ou o RPG não conseguir trazer aquele êxtase pós-sessão, quando estou feliz o que mais penso é "o que eu poderia fazer em minha nova sessão?".
    Vou começar o curso de psicologia e estava duvidoso e receoso. Mas vendo o seu caso, sinto muita vontade de estudar e continuar com os meus planos de futuramente usar RPG como uma terapia.
    Muito obrigado pelo texto incrível.
    Fique bem.

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